Fumar ou não fumar - construindo suas escolhas

João R. Vieira, psicólogo

Não vamos aqui aterrorizar ninguém para parar de fumar, nem a perseguir os colegas.

Não vamos ficar despejando sobre você, como uma “metralhadora macabra”, números como as cinco milhões de pessoas que morrem todos os anos no mundo, em razão de doenças provocadas pelo uso do cigarro  (duzentas mil só aqui no Brasil), ou as mais de 600 mil fumantes-passivas (convivem com fumantes). Nem vamos alardear que o fumo é responsável por 30% das mortes por câncer; 90% das mortes por câncer no pulmão; 97% do câncer da laringe; 25% das mortes por doença do coração; 85% das mortes por bronquite e enfisema; 25% das mortes por derrame e por 50% dos casos de câncer de pele.

Isso todo mundo já sabe, e apesar disso, ainda se fuma muito.

Queremos, sim, contribuir para que fumantes e não-fumantes lancem um olhar mais profundo sobre esta questão, busquem compreender como são envolvidos. E, a partir disso, tenham mais chances de sucesso numa mudança  que vai muito além do simples ato de fumar.

Os 05 “D”s

Resumimos em cinco passos um bom plano de “gestão do tabagismo”: Desautomatize. Desperte. Diferencie. Decida. Direcione.

Desautomatize

Tudo que é automático repete-se incessantemente, sem a menor opção de escolha. Então, o primeiro passo a dar é definir quais são aqueles momentos em que você consegue realmente parar e apreciar o seu cigarro. A partir daí, atenha-se apenas a eles. Elimine todos os outros cigarros que você fuma às pressas, no meio do seu corre-corre, só para aliviar a pressão.

- Respire. Quando sentir vontade de fumar fora dos momentos escolhidos, inspire profundamente, retenha o ar um pouco, e expire soprando pelos lábios: você está mesmo é precisando respirar!

- Troque fumaça por aroma.  Uma boa dica é andar com alguma folha ou essência natural de erva no seu bolso, como o alecrim, a camomila, a lavanda. Respire da maneira descrita no item anterior, aspirando o aroma.

- Ocupe sua boca com um sabor agradável.  Ficar com um pedacinho de cravo na boca, casca de laranja ou limão, gengibre... além de melhorar o seu hálito, pode ajudar a desviar o impulso de fumar. 

- Troque os hábitos de apoio. Mude freqüentemente os seus rituais, tudo o que está relacionado e mantém o hábito de fumar, como por exemplo: se fuma após o banho, experimente antes; troque o cantinho na varanda a que está acostumado pelo quintal; se associa o fumar a uma xícara de café, troque por uma de chá, etc.

- Torne o cigarro menos acessível. Tire o maço de cigarro do bolso, onde está acostumado a pegá-lo automaticamente, e guarde-o, por exemplo, no fundo de uma gaveta, talvez até embrulhado numa sacola plástica com um pequeno nó a ser desatado. Você terá mais chance de decidir se realmente escolhe fumar nesse momento.

 

  

DesPerte

- Pare de enganar-se. Fumar é um a hábito plantado com mentiras. Ao contrário do que veio sendo propagandizado sistematicamente, por décadas, em anúncios muito bem produzidos, o cigarro na verdade lhe tira aquilo que promete: rouba o prazer e a sensibilidade, rouba a energia, o seu fôlego; rouba a alegria, estimula a ansiedade.

“Com ele (o cigarro) tudo parece que fica melhor. Sem ele tudo parece incompleto.” Assim como um viciado em televisão é insuportável o silêncio de sua casa quando aquela encontra-se desligada. ⁽⁰²⁾

- Diferencie.

Digamos, por exemplo, que você tenha fome. O que lhe vai satisfazer é comida, que saciará as necessidades do seu organismo, que embasam o seu desejo. Entretanto, as coisas podem ficar bem mais complexas, quando se confunde, por exemplo, afeto e alimento: você passa a comer mais quando está carente de afeto, e, como comer não resolve o seu problema, continua a sentir o desejo de comer. Este mecanismo ocorre também com o cigarro: se você se sente “preso”, e alivia-se “respirando” um cigarro, deixa de identificar e enfrentar o que realmente o aprisiona, e não aprende o caminho para superá-lo.  “ Surge uma certa saciedade, ao fumar, mas o problema é que esta saciedade esvai-se muito rapidamente, como miragem no deserto. E logo vem aquela ansiedade de novo. Por isso sempre faz parte do vício o exagero, a violência.”

O que lhe deixa ansioso? O que tornaria a sua vida mais intensa e harmoniosa de verdade? A partir do momento em que não responde mais a essas e outras questões com um cigarro..., brota uma consciência, que lhe impede de se enganar. ⁽⁰²⁾

Evite cruzar o desejo de fumar com outras coisas: fumar para acordar, para comer, para dormir, para conversar com os amigos, porque está triste, porque está alegre...  Fume só mesmo se estiver com vontade de fumar.

- Decida.  Com os passos anteriores você conseguirá reduzir bastante sua compulsividade e o número de cigarros consumidos. Mas a consciência e a sensibilidade despertada acabarão por impeli-lo a uma decisão, que brotará espontaneamente do seu íntimo, dentro do seu ritmo. Então, quando chegar o seu momento, decida-se a fazer o caminho de volta: trocar o cigarro por aquilo que ele vem tentando substituir na sua vida. Decida-se responder de maneira mais verdadeira à suas necessidades.  Decida-se a não fumar, por este momento, por esta hora, por hoje!

- Direcione.  Não deixe solta a sua decisão, como se dependesse apenas de sorte para dar certo. Tendo concluído que esta é uma questão realmente importante para você, crie um plano, defina muito bem quais estratégias vai utilizar, escolha um método que lhe desperte confiança, procure ajuda de um profissional, um médico ou psicólogo, se julgar necessário.

“Conforme você vai acumulando ações bem direcionadas, vai sendo elevado a um nível superior do seu crescimento. Como uma escada onde, a cada degrau, um novo desafio e uma nova oportunidade apresentam-se a você.” ⁽⁰¹⁾

* João R. Vieira

 Psicólogo, autor de  ⁽⁰¹⁾ “O Caminho – o livro das buscas”, ⁽⁰²⁾ “Ícaro decide viver” (prelo), colaborador da CLM – Gestão em Saúde. Desenvolve um Programa de Apoio às Lideranças na Gestão da Qualidade de Vida ( Avon – Osasco).